segunda-feira, 2 de novembro de 2009

A primeira obra prima de Paul Thomas Anderson



Acabo de assistir mais uma vez um dos melhores filmes já produzido em Hollywood, na minha opnião. Do diretor Paul Thomas Anderson, "Boogie Nights - Prazer sem limites" é o segundo filme da carreira do cara que posteriormente viria a dirigir outra obra prima: "Magnólia" - mas isso é um assunto para um outro post - Dentre a sua filmografia estão também "Embriagado de amor" e o último "Sangue Negro".

Bom, voltando ao filme que é tema deste texto, só para situar, "Boogie Nights" conta a história da ascenção e queda de um ator pornô entre as décadas de 70 e 80. Eddie Adams, um jovem de 17 anos, vive uma vida pacata morando com os pais e trabalhando dia todo, como lavador de carros e funcionário da cozinha de uma boate. Possui um dom, se é possível denominar assim. O presente que Deus lhe deu, foi um pênis de 33 cm, que acaba fazendo a fama do jovem na cidade. Isso faz com que um produtor de filmes pornôs em ascenção o convida para estrelar suas produções. Com isso, Eddie, agora Dirk Diggler (seu nome artístico) conhece o sucesso, mas por exageros com as drogas acaba se perdendo e fracassando na "promissora" e rentável carreira. Com uma trilha sonora muito bem escolhida e um fabuloso time de atores como Mark Wahlberg ( em sua melhor atuação) , Julianne Moore (perfeita) e Burt Reynolds (isso mesmo! você leu direito), "Boogie Nights" já nasceu clássico! Definitivamente é um filme obrigatório para todos.

Segue a resenha feita por Pablo Villaça, crítico com site Cinema em Cena:


Dirigido por Paul Thomas Anderson. Com : Mark Wahlberg, Burt Reynolds, Julianne Moore, John C. Reilly, William H. Macy, Heather Graham, Nicole Ari Parker, Don Cheadle, Joanna Gleason, Luis Guzman e Nina Hartley.

Boogie Nights é um filme de Tarantino sem Tarantino. O roteiro usa e abusa dos elementos consagrados pelo diretor de Pulp Fiction: longas cenas filmadas em tomada única; diálogos afiados que não acrescentam muito à narrativa; personagens fortes que se mantém firmes em seus propósitos; uma trilha sonora extremamente bem escolhida; e, finalmente, a utilização da violência como forma de humor.

No entanto, Boogie Nights pode ser tudo, menos uma cópia de Pulp Fiction ou Cães de Aluguel. Não, este filme tem vida própria. A história gira em torno de Eddie (Wahlberg), um rapaz de 17 anos que é convidado pelo grande diretor do cinema pornô Jack Horner (Reynolds) para estrelar os novos filmes deste. A partir daí, a narrativa segue a escalada de Eddie (ele passa a se chamar Dirk Diggler) rumo ao sucesso, seu apogeu e, finalmente, seu declínio em função das drogas e de sua própria personalidade. Ah, um `detalhe` (se é que podemos dizer isso): Diggler tem um pênis de 30cm de comprimento, o que facilita um pouco sua ascensão no meio pornô.

Falar de Boogie Nights é falar em atuações. E estas são perfeitas, a começar pelo próprio Mark Wahlberg, que constrói um Dirk Diggler inicialmente inseguro, deslumbrado com as possibilidades que se abrem a sua frente e que, depois, se torna um sujeito arrogante e viciado em drogas. Burt Reynolds também está fabuloso como Jack Horner e, apesar de não ser um grande fã do ator (e o ser de Robin Williams), vendo este filme não consigo deixar de pensar que Reynolds merecia o Oscar de Ator Coadjuvante que foi para Williams. O mesmo se aplica a Julianne Moore, cuja atuação é a mais complexa de todo o filme: ela é uma mulher extremamente maternal, gentil e sensata e que, no entanto, não pensa duas vezes antes de enfiar o nariz em uma carreira de cocaína ou de trepar (como dizem todos no filme) com Dirk na intenção de lhe demonstrar seu amor de `mãe`.

Mas estou sendo injusto: apesar destas três atuações serem as mais `importantes` da história, o filme não seria nada se não fosse o universo de personagens extremamente interessantes e bem caracterizados que povoam a narrativa. Aqui, nenhum personagem `sabe` que é coadjuvante: todos tem seus próprios problemas e sua própria vida, não vivendo, simplesmente, em função das ações dos protagonistas, como costuma acontecer em 99% dos filmes americanos. Um exemplo claro disso é Little Bill, personagem de William H. Macy, um homem cujo drama é, ao mesmo tempo, divertido e comovente: sua esposa tem a `mania` de sair transando com seus amantes (leia-se: qualquer homem que se oferecer) em qualquer lugar e em qualquer ocasião, como em uma festa, por exemplo, na qual Little Bill também está presente.

Povoado por uma galeria de personagens interessantes, o filme ainda conta uma história envolvente e potencialmente cinematográfica (afinal, não há nada mais dramático do que a velha fórmula `ascensão-glória-declínio`, que aqui ganha novos contornos). Os diálogos são, como já mencionado, afiadíssimos, e Paul Thomas Anderson permite que seus atores se sintam livres para interpretar, sem terem que ficar preocupados com questões técnicas. Para evitar isso, o diretor simplesmente liga sua câmera e grita `ação!`, deixando os atores à vontade: algumas tomadas chegam a ter mais de dois minutos, o que também não é comum em Hollywood, que prega a lei da `montagem histérica`. Aqui, não: nós acompanhamos Reed Rothchild enquanto este prepara uma bebida para Eddie/Dirk; acompanhamos Little Bill enquanto este sai de uma festa, vai até seu carro e volta; e assim por diante. Isso nos torna mais próximos dos personagens, porque é feito com um objetivo e não apenas como exercício de estilo, como o próprio Tarantino fez algumas vezes em Jackie Brown.

Outra coisa interessante é a forma descontraída com que o roteiro, que também é de Thomas Anderson, trata de um assunto `pesado` como sexo pago, drogas e violência. Para constatar isso, basta notar que em nenhum momento a AIDS surge como conseqüência dos `desvarios` dos personagens, o que seria algo normal, se considerarmos que a história aborda o final da década de 70 e início da de 80, período no qual a doença `surgiu` (ou melhor: foi notada). Além disso, as próprias mortes que acontecem no filme são tratadas de uma maneira `leve`, mais com a intenção de justificar um determinado argumento do que de chocar. Um exemplo é a cena na qual uma protegida do Coronel sofre uma overdose, logo no início do filme: o grotesco da situação é mostrado de uma forma tão natural que o ridículo se acentua - e a platéia se surpreende rindo. É mais ou menos o que Tarantino fez na cena em que Mia Wallace sofria uma overdose em Pulp Fiction.

É claro que o roteiro também tem seus pequenos `buracos`. Por exemplo: o que acontece à família de Eddie/Dirk? Afinal, ele passa a morar em um local não muito distante ao lugar onde sua mãe mora e, assim, seus pais devem ter ficado cientes de sua nova profissão. Portanto, por que o filme se esquece deles? Infelizmente, o fato é que a mãe de Eddie nada mais é do que o `estopim` que o roteiro encontrou para fazer com que o rapaz aceitasse trabalhar para Jack Horner.

No entanto, isto é um pecadilho se considerarmos a qualidade do restante do roteiro. Na verdade, estou começando a acreditar que não existe script perfeito (afinal, até Cidadão Kane tem um erro grosseiro, que é o fato de ninguém estar perto de Kane quando este morre. Assim, como é que o mundo poderia ter ficado sabendo que sua última palavra foi `Rosebud`?).

Boogie Nights deveria ter sido mais valorizado pela crítica e público americanos. Aqui no Brasil, a se julgar pelo cinema lotado em que eu estava, o filme vem recebendo o devido valor que merece. Talvez isso aconteça em função da mentalidade mais aberta do brasileiro. Talvez porque o americano seja conservador demais. Talvez porque Boogie Nights é, simplesmente, um filme fabuloso.

26 de Maio de 1998


Fonte: www.cinemaemcena.com.br